DIFUSÃO
IDEOLÓGICA PELA MÍDIA BRAZILEIRA
Juntamente com o cinema, os quadrinhos e a
música, a TV difundiu à exaustão conceitos
como os apresentados abaixo:
- Os estadunidenses, ou melhor, "os
americanos" eram os grandes defensores da liberdade e da
democracia, enquanto a União Soviética e os socialistas
em geral difundiam o terror, praticavam "lavagens cerebrais"
e "exportavam" espiões para as terras do "mundo
ocidental e livre";
- O muro de Berlim, ou "muro da vergonha",
teria sido erguido por interesses "exclusivamente russos",
que haviam transformado o lado oriental da cidade em verdadeiro
"campo de concentração";
- Os alemães nazistas e os russos
socialistas, "apesar de perversos" e da alta tecnologia
de que dispunham, apresentavam uma ingenuidade bastante primária
diante da astúcia e heroísmo dos seus inimigos
norte-americanos;
- Os japoneses (da segunda guerra mundial),
os coreanos (do pós-guerra) e os vietcongues (da década
de 1960), envolvidos em guerras com os americanos, eram "fanáticos
irracionais e traiçoeiros". Os chineses (naquela
altura já "socializados") eram "enigmáticos,
misteriosos e suspeitos";
- Os verdadeiros "vencedores da democracia"
na Segunda Grande Guerra eram os americanos, coadjuvados por
ingleses e franceses. Eram raras as cenas de filmes que mostravam
os soviéticos como aliados e vencedores também;
- Os USA ofereciam a todos os que lá
viviam, ou para lá se dirigiam, facilidades de trabalho
bem remunerado, casas bem equipadas com eletrônicos diversos
e possibilidades de ascensão fácil;
- Índios "impermeáveis
ao progresso", às vezes ingênuos, outras vezes
cruéis e vingativos, escalpelavam impiedosamente valentes
e laboriosos pioneiros e missionários, suas fiéis
e dedicadas mulheres e crianças de sorrisos angelicais
e faces rosadas e sardentas;
- As famílias americanas, apesar
de pequenos desentendimentos do casal, dividiam alegremente
entre seus membros as tarefas domésticas e divertiam-se
animadamente em week-ends e picnics comunitários primaveris, transformando
até mesmo as convenções partidárias
em "fantásticos shows da vida";
- Policiais nunca eram corruptos. Abnegados
trabalhadores a serviço da ordem e tranqüilidade
da nação, sacrificavam o convívio com a
família, o lazer, e arriscavam a vida para salvar pessoas
de toda espécie de perigos;
- O espírito jovial, o coração
sempre aberto e pronto a desculpar os deslizes do namorado,
a fidelidade, a perseverança, algum truque para acentuar
sua beleza, o glamour garantiam, no final, um bom marido às
"moças casadoiras";
- Os heróis eram leais aos seus
amigos e à pátria. Corajosos enfrentavam qualquer
risco para salvar crianças, mulheres, velhos ou animais
em perigo. Rápidos no raciocínio e no gatilho,
tinham um olhar avassalador, tiros e muros certeiros, obstinação
para atingir seus objetivos, mas não resistiam à
sedução de mulheres fatais, pois afinal os "apelos
da carne" são muito fortes "nos homens!";
- Cidadãos e (raras vezes) algumas
cidadãs eram dotados de poderes mágicos, vindos
de alguma força benéfica sobrenatural, que os
transformavam em trabalhadores incansáveis a serviço
do bem-estar das populações. Não tinham
sequer tempo de constituir sua própria família
e dar vazão às suas necessidades afetivas e sexuais
mais básicas.
Fonte: "A invasão
cultural norte-americana", de Júlia Falivene Alves,
Editora Moderna, 1988. |