A
ORIGEM DO MATE SEGUNDO OS JESUÍTAS
Um
dia Cristo desceu à terra, acompanhado por São João
e São Pedro, e veio ter às selvas americanas. Depois
de um penoso viajar pelas florestas sem fim, encontrou - perdido
no fundo dos bamburrais - o rancho de um velho índio que
ali morava em companhia de sua filha, jovem de deslumbrante formosura.
Os três viajantes foram muito bem recebidos, e Jesus resolveu
premiar aquela franca hospitalidade que encontrara no rancho do
selvícola. Indagando-lhe o que mais desejava em sua vida,
recebeu esta resposta: - Senhor!
Anhangá tomou conta dos corações humanos: as
guerras incendeiam os campos de minha terra, e não há
mais tranqüilidade nas tabas de meu povo. Vencedores, os guerreiros
não poupam os vencidos: os homens são trucidados e
as mulheres jovens são arrastadas a satisfazer os mais baixos
instintos. Por isso, fugi de minha tribo e vim enterrar-me no escuro
das florestas. Não por salvar-me, que pouco me resta viver.
Mas para afastar minha filha das garras do pecado. Sei que em breve
morrerei, e o que mais me acabrunha é pensar que a deixarei
desprotegida, novamente exposta à fúria das paixões.
Assim, Senhor, se alguma cousa me fosse dado pedir, eu pediria uma
eterna proteção à alma de minha filha. Que
ela fosse eternamente bondosa, eternamente pura, eternamente linda:
Respondeu Jesus: -
Se Anhangá hoje impera em tuas selvas, podes crer que o Deus-do-bem
voltará a estender seu manto de paz sobre a taba de teus
irmãos. As selvas se encherão de cânticos e
as almas se encherão de luz. É o Deus-do-Bem que me
envia para proteger teu povo... Tu, que foste bom, generoso e hospitaleiro,
mereces ser recompensado. Farei de tua filha aquilo que me pedes.
Símbolo da bondade, ela retribuirá o mal com o bem:
aos que quiserem roubar as delícias do seu corpo, premiará
com a fartura nos ranchos. E nenhuma força será capaz
de abatê-la, pois por mais que a queiram aniquilar, sempre
haverá de renascer, triunfante, trazendo força e inteligência
aos homens de tua raça. Tua filha será eternamente
linda e eternamente pura, pois. transformá-la-ei na mais
linda e mais pura das árvores; linda no contorno das folhagens
e pura no manto verdejante que lhe descerá até os
pés. Tua filha será eternamente linda, eternamente
pura e bondosa... E Deus
a transformou na erva-mate... SÂO
TOMÉ NA AMÉRICA Quando,
em 1624, os padres Montoga e Mendonza fundaram a vila de Encarnación,
importante missão jesuítica posteriomente destruída,
tiveram curiosidade em saber o que pensavam os selvícolas
a respeito do mate, bebida que já constituía um hábito
característico do Paraguai. Tiveram por resposta que a erva-mate
lhes servia de alimento e remédio desde o dia em que Pai-Zumé,
um estranho personagem que há muito tempo estivera naquelas
tabas, lhes ensinara como aproveitar as folhas da caá (que
até então julgavam venenosas), e como lhes usufruir
os efeitos medicinais. Contavam também os indígenas
que Zumé era um homem poderoso: as selvas brutas conservavam
intacto o caminho por onde ele passara, desde o Tibagi até
o Piquiri; e às margens deste rio, Zumé havia deixado,
numa pedra, o sinal de seus pés - testemunho eterno de sua
passagem por aquelas terras. Os dois jesuítas logo
aliaram a figura de Zumé à pessoa de São Tomé,
o apóstolo que provavelmente teria visitado o continente
americano pregando a doutrina de Cristo. A versão cristianizada
da lenda logo se espalhou entre as populações brancas,
e em breve era voz corrente que a erva-mate havia sido descoberta
e bendita pelas mãos de São Tomé. Isto é
o que vamos encontrar em muitos livros da época, a iniciar-se
pelo Tratado sobre o uso do mate no Paraguai, escrito pelo licenciado
Diego Zevallos em meados do século XVII e publicado em Lima
no ano de 1667. Lozano, no capítulo VIII de sua
História de la Conquista del Paraguay, também se
refere a São Tomé, narrando que durante uma terrível
peste que assolara as tribos guaranis, foi aquele santo o salvador
do gentio, ensinando-lhes como preparar a erva-mate, eficaz remédio
contra aquela epidemia e muitas outras doenças.
A peste foi vencida, e a milagrosa bebida, cujo uso se generalizara
por todas as tabas guaranis, continuou a prestar inúmeros
benefícios. E por muito tempo os selvícolas guardaram
na memória a figura daquele bom Zumé, que um dia,
apesar das súplicas e protestos gerais, teve de deixar as
terras do Paraguai. Santo Tomé les responde:
Os tengo que abandonar
Porque Cristo me ha mandado Otras tierras visitar.
En recuerdo de mi estada Una merced os he de dar,
Que es la yerba paraguaya Que por mi bendicta está.
Santo Tomé entró en el rio Y en peana
de cri tal La aguas se lo llevaron A las l anuras
del mar. Los indios, de zu partida No se pueden
consolar, y a Diós sempre están pidiendo
Que vuelva Santo Tomás.
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Trecho extraído do livro "História
do Chimarrão", de Barbosa Lessa.
Cortesia:
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