PAYADAS DE JAYME CAETANO BRAUN

 

China

A maior das gauchadas
Que há na sagrada escritura,
Falo como criatura,
Mas penso que não me engano,
É aquela em que o soberano,
Na sua pressa divina,
Resolveu fazer a china
Da costela do paisano!

Bendita china gaúcha
Que és a rainha do pampa
E tens - na divina estampa,
Um quê de nobre e altivo;
És perfume - és lenitivo
Que nos encanta e suaviza
E num instante escraviza
O índio mais primitivo!

Fruto selvagem do pago,
Potranquita redomona,
Teus feitiços de madona
Já manearam muito cuera,
E o teu olhar de pantera,
Retovado de malícia
Nesta querência patrícia
Fez muito rancho tapera!

Refletem teus olhos negros
Velhas orgias pagãs
E a beleza das manhãs,
Quando no campo clareia...
Até o sol que te bronzeia
Beijando-te a estampa esguia
Faz de ti - prenda bravia,
Uma pampeana sereia!

Jamais alguém contestou
O teu cetro de realeza!
E o trono da natureza
É teu - chinoca lindaça...
Pois tu refletes com graça
As fidalgas açorianas,
Charruas e castelhanas
Vertentes vivas da raça!

A mimosa curvatura
Desse teu corpo moreno
É o pago em ponto pequeno
Feito com arte divina,
E o teu colo que se inclina
quando suspiras com ânsia
São dois cerros - na distância,
Cobertos pela neblina!

Quem não te adora o cabelo
Mais negro que o picumã?
E essa boca de romã
Nascida para o afago,
Como que a pedir um trago
Desse licor proibido
Que o índio bebe escondido
Desde a formação do pago

Pra mim - tu pialaste os anjos
Na armada do teu sorriso,
Fugindo do paraíso
Para esta campanha agreste,
E nalgum ritual campestre,
Por força do teu encanto,
Transformaste o pago santo
Num paraíso terrestre!


Organização e Digitalização: Iuri Abreu